A
importância da febre aftosa em saúde pública
Edviges Maristela Pituco
pituco@biologico.sp.gov.br
Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Sanidade Animal
pituco@biologico.sp.gov.br
Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Sanidade Animal
Número 17
13/10/2005
Introdução
Os agentes de doenças animais prejudicam a população humana de diversas formas, provocando doenças que são as chamadas zoonoses, ou seja, as doenças que se transmitem dos animais vertebrados ao homem. Representam uma importante ameaça, pois, além de afetarem a saúde e o bem estar, diminuem a produtividade dos rebanhos e reduzem a disponibilidade de alimentos protéicos para a população humana. Para examinar a importância da saúde animal para a saúde humana, devemos considerar a definição de saúde da Organização Mundial da Saúde como um guia. “...Saúde não é a mera ausência de doença ou injúria, é um estado de completo bem estar físico, mental e social...”. A Saúde Pública Veterinária contribui diretamente para alcançar este objetivo, pois “...compreende todos os esforços comunitários que influenciam e são influenciados pela Medicina Veterinária e Ciência aplicada para a prevenção de doença, proteção da vida, e promoção do bem estar e eficiência do homem...” e permite um campo de trabalho ilimitado, ao participar no estudo da inter–relação de doença e saúde no homem e animais. A febre aftosa representa uma importante ameaça para o bem estar da população, devido ao seu impacto sobre a economia nacional de diversos países, onde o comércio com o exterior e estabilidade, dependem diretamente da confiabilidade dos alimentos de origem animal, que devem ser oriundos de animais isentos desta enfermidade, demonstrando a estreita relação que existe entre saúde pública, o ambiente e o bem estar sócio-econômico. A importância da febre aftosa em saúde pública seria ínfima se não considerássemos sob o ponto de vista social e econômico. Afeta os produtores, empresários e famílias rurais por seus efeitos desfavoráveis sobre a produção, produtividade e rentabilidade pecuária. Incide negativamente nas atividades comerciais do setor agropecuário, prejudicando o consumidor e a sociedade em geral pela interferência que a enfermidade exerce na disponibilidade e distribuição dos alimentos de origem animal, assim como pelas barreiras sanitárias impostas pelo mercado internacional de animais, produtos e subprodutos. E mais, onera os custos públicos e privados, pelos investimentos necessários para sua prevenção, controle e erradicação. Apesar da enfermidade de ter sido descrita pela primeira vez em 1546, e dos esforços para o controle e erradicação, continua sendo alvo de permanente pesquisa e preocupação. Nos anos 2000 e 2001, a febre aftosa voltou às manchetes dos jornais de todos os continentes, e as imagens dos milhares de animais sendo sacrificados ficarão para sempre registrados na memória da população mundial. A reintrodução do vírus em países e regiões reconhecidas como livres ocasionou elevados prejuízos econômicos e sociais, como no Japão e Taiwan, livres da doença há quase 100 anos, vários países da Comunidade Européia, livres há 10 anos, Argentina, Uruguai Circuito Pecuário Sul do Brasil já reconhecidos como livres, fez com que a comunidade científica e todas as classes sociais se preocupassem com o assunto. No Brasil, a febre aftosa é um fator limitante para o desenvolvimento econômico da indústria animal. Sua presença impõe a adoção de medidas sanitárias no comércio interno de animais e seus produtos não tratados, de áreas infectadas para áreas livres bem como internacional. |
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A doença
A febre aftosa é uma enfermidade viral, muito contagiosa, de evolução aguda, que afeta naturalmente os animais biungulados domésticos e selvagens: bovinos, bubalinos, ovinos, caprinos e suínos. Entre as espécies não biunguladas, foi demonstrada a susceptibilidade de elefantes e capivaras. É considerada como zoonose, porém com raros casos em humanos e em situações muito especiais. Caracteriza-se por febre e formação de vesículas na cavidade bucal e espaços interdigitais. O vírus pertence à família Picornaviridae, gênero Aphthovirus. Seu genoma é constituído por uma única molécula de RNA. Foi demonstrado como agente etiológico da febre aftosa em 1897 por Loeffler e Frosch. São conhecidos 7 sorotipos antigênica e imunogênicamente diferentes: O, A, C, SAT 1, SAT 2, SAT 3 e Ásia 1. No Brasil foram identificados 3 tipos: A, O e C . O agente apresenta grande tendência a mutações que originaram numerosos subtipos e centenas de cepas diferentes, mas com certo grau de proteção cruzada. O aparecimento de novos subtipos em uma região leva a falhas de imunidade das vacinas utilizadas e como conseqüência, podem aparecer surtos. Estas diferenças genéticas entre os agentes de doenças são o motivo pelo qual se impõem barreiras sanitárias para evitar que o vírus seja trazido junto com animais, produtos e subprodutos importados, mesmo que sejam agentes de doenças já existentes no país. O vírus da febre aftosa é lábil em pH ácido (menor que 6) e alcalino (maior que 9), é sensível aos desinfetantes químicos como carbonato de sódio a 4%, formol a 10%, hidróxido de sódio 2% (soda cáustica) e meios físicos como calor, radiação ultravioleta, ionização por raios gama e luz solar.
Fonte
de infecção e modo de transmissão
O animal infectado elimina o vírus
por todas as secreções e excreções (saliva, sêmen, leite, urina e fezes),
contaminando o meio ambiente. Os títulos mais altos do vírus se encontram no
líquido das vesículas e no epitélio das lesões.
Os produtos derivados de animais infectados podem estar contaminados. De acordo com o processamento, são considerados de maior ou menores riscos de infecção. Por exemplo, a carne in natura com gânglios, órgãos, medula óssea e sangue é de alto risco, igualmente o leite não tratado e subprodutos como manteiga. Tem-se demonstrado, que produtos contaminados transmitem a infecção aos animais susceptíveis. O código zoosanitário Internacional da OIE estabelece que as carnes devem ser submetidas a um processo de maturação a uma temperatura superior a +2ºC ou seja, temperatura levemente superior ao ponto de congelamento, durante um período mínimo de 24 horas após o abate e neste período o pH da carne será medido no centro do músculo Longissimus dorsi e este não deverá alcançar um valor superior a 6,0. É importante salientar que a maturação da carne inativa o vírus nos tecidos musculares esqueléticos e cardíacos, devido à queda do pH, causada por formação de ácido lático, o qual usualmente acompanha o rigor mortis. Em pH 6,0 o vírus é inativado a uma taxa de 90% por minuto, enquanto que em pH 5,0 a taxa de inativação é de 90% por segundo. Contudo o vírus pode sobreviver por mais de 80 dias em carnes congeladas, antes que aconteça a maturação. O vírus aftoso pode persistir por longos períodos em coágulos sangüíneos, medula óssea, gânglios linfáticos, fragmentos ósseos e vísceras, pois estes tecidos não sofrem a queda de pH que acompanha o rigor mortis. O pH da carne bovina no momento do abate é cerca de 7,2 e uma hora depois oscila entre 6,5 – 6,8. Após 24 horas de armazenamento, sob temperatura levemente superior ao ponto de congelação, o pH médio situa-se entre 5,6 –5,8. Os animais susceptíveis podem infectar-se por contato direto com o conteúdo das vesículas, saliva ou excreções e secreções dos animais doentes. Há também o contágio de forma indireta por água, alimentos ou fômites (vestimenta, instrumentos, equipamentos etc.) contaminados. A infecção se transmite, sobretudo por aerossóis, sendo a via digestiva (faringe) a mais comum para penetração do vírus, ocorrendo ainda, pelas vias respiratórias (inalação) e úbere. |
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Diagnóstico
A febre aftosa pertence ao chamado grupo de doenças vesiculares, no qual estão incluídas a Estomatite Vesicular, o Exantema Vesicular dos Suínos e a Doença Vesicular dos Suínos. Estas doenças têm em comum a propriedade de provocar a formação de vesículas típicas com coloração esbranquiçada contendo líquido incolor ou ligeiramente sanguinolento, sendo seu diagnóstico baseado nos sintomas clínicos, nos dados epidemiológicos e no diagnóstico laboratorial. Entre as espécies de interesse econômico, a discreta intensidade das lesões em ovinos, caprinos e búfalos fazem com que o diagnóstico clínico seja bastante difícil. São frequentes os casos em que animais doentes destas espécies não demonstram sintomatologia clínica, mesmo estando em íntimo contato com bovinos doentes. Isso não significa que não estejam infectados ou mesmo doentes. Esta é a maior causa de persistência do vírus em muitas regiões e uma das principais responsáveis pelas variações antigênicas de cepas de campo durante surtos. O diagnóstico laboratorial é orientado para o isolamento e identificação do vírus, a partir de amostras de epitélio das vesículas ou líquido existente nestas, em lesões de língua, patas ou úbere. O sorodiagnóstico algumas vezes é possível a partir de amostras pareadas, quando se busca a conversão de níveis de anticorpos, porém, não é o método ideal em se tratando de animais vacinados.
Fonte
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